
Em São Felix do Araguaia, é comum encontrarmos pequenas placas na frente das casas anunciando "manicure", "costureira" ou "vendo bananas". Os pequenos negócios informais respondem por parte importante da economia local, porém tem uma capacidade limitada para investir e crescer. São trabalhadoras e trabalhadores criativos no campo ou na cidade, mas sem capital ou condições de acessar o crédito dos bancos tradicionais. Foi justamente pensando no apoio a estas pessoas que surgiu o projeto Crédito Popular Solidário (CPS) da ANSA.
Tudo começou em 1999, a partir de uma proposta do presidente da Fundação Heres na Espanha, para a ANSA. O desafio era conceber um projeto em São Felix do Araguaia nos moldes do Grameen Bank, referência em microcrédito implementada por Muhamad Yunus em Bangladesh. A ANSA aceitou o desafio e em 2000 foi iniciado o trabalho.
Até final de 2016, a iniciativa de microcrédito da ANSA já emprestou mais de 6 milhões de reais.
A diferença do microcrédito para o crédito tradicional concedido pelo sistema bancário não está só no montante emprestado. Enquanto os bancos comerciais exigem garantias materiais para conceder um empréstimo, no microcrédito, a garantia é a própria comunidade. Cria-se uma relação de confiança entre os integrantes de um grupo solidário e entre este grupo e o Agente de Crédito. No grupo solidário, os membros avalizam entre si as atividades produtivas de cada um. A equipe do CPS se faz presente apoiando no andamento dos projetos e pagamentos. Assim, retoma-se a origem latina da palavra crédito, credere, com o sentido pleno de "acreditar".
O Crédito Popular já fechou mais de 2.000 contratos de empréstimos solidários. São apoiados projetos nas mais diversas áreas, como confecção de artesanato, produção de hortaliças, criação de galinhas e revenda de roupas e perfumes. Para ter acesso ao Crédito Solidário, a renda por pessoa na família deve ser de até um salário mínimo e deve-se constituir um grupo solidário de 4 a 6 pessoas.
Atualmente, o CPS concede microcrédito para 400 pessoas ao ano, sobretudo mulheres, nas cidades de São Felix do Araguaia e Alto Boa Vista e ainda no Projeto de Assentamento (PA) Dom Pedro e no distrito de Pontinópolis, ambos no município de São Félix do Araguaia.
Dona Iraídes, de Pontinópolis, é um exemplo típico das pessoas que procuram o CPS. Formada em curso de manicure em São Felix do Araguaia, não tinha recursos para desenvolver seu negócio. Através do empréstimo no CPS, comprou os equipamentos de manicure e construiu dois cômodos onde instalou seu salão. "Gostei muito da confiança das companheiras do meu grupo e das pessoas que trabalham no projeto. Muitas vezes só precisamos de uma ajuda, não de caridade para melhorar de vida”, conta Dona Iraídes.
Em 2010, o CPS deu um passo importante na sua consolidação formal com a criação da Organização Ecossocial do Araguaia – OECA. A OECA é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) que garantiu a legalidade das atividades realizadas pelo CPS e a possibilidade de crescimento da iniciativa.
O projeto também firmou uma parceria com a Rede de Sementes do Xingu. Nela, a OECA gerencia o Fundo Rotativo da Rede que apoia o investimento dos grupos de coletores de sementes, com recursos do Instituto Socioambiental (ISA). Atualmente, o CPS conta com o apoio da Fundação Fontilles, da Espanha, da Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE) e da Sociedade Inteligência e Coração (SIC), entidades de caráter social ligadas à Igreja Católica.
Na sua caminhada, o CPS se firma como um projeto concreto na construção de uma economia solidária no Araguaia.